AGROQUÍMICOS: NOVO PRODUTO PROMETE SE LIVRAR DELES
Produto criado por cientista e empreendedora de São Paulo promete remover metais pesados provenientes do uso de agroquímicos no cultivo de alimentos
Uma das complicações relacionadas ao uso excessivo de agroquímicos na agricultura é a acumulação de metais pesados em alimentos. Presentes em fertilizantes e agrotóxicos, substâncias como chumbo, cádmio, mercúrio e arsênio podem se acumular em frutas, verduras e legumes em níveis acima do ideal.
Em excesso, esses metais podem causar problemas neurológicos e intestinais, além de estarem associados a doenças canceríginas. Muitos consumidores procuram evitar a ingestão desses metais e outras substâncias tóxicas dando preferência a produtos orgânicos.
Esta opção, contudo, nem sempre está disponível. Foi pensando nisso que a cientista e empreendedora Taynara Alves, fundadora da startup InQuímica, de São Paulo, criou uma solução capaz de remover boa parte dos metais pesados dos alimentos.
“PURO E BOM”
Ainda em processo de certificação, porém com resultados positivos em laboratório, o produto – batizado de “Puro e Bom” – tem a propriedade de se ligar àqueles metais e remover até 85% deles por meio de uma reação química conhecida como “quelação”.
“Em termos lúdicos, é como se a molécula do metal pesado ficasse envolvida dentro de uma bolha de sabão. É uma área ainda nova da química”, explica Taynara.
O processo, que consiste em mergulhar o alimento em uma solução do produto com água, dura cerca de 40 minutos. Segundo a cientista, trata-se de uma fórmula natural e sem risco para a saúde.
A empreendedora – que atua na pesquisa em laboratório desde o fim do ensino médio, quando ingressou em um curso técnico em química – conta que a ideia surgiu por volta de 2011.
Na época, a questão da presença de metais pesados na indústria cosmética estava em alta. “Pesquisando sobre onde mais havia metais pesados, cheguei aos alimentos e entendi que eram provenientes da utilização de agroquímicos. E que, da mesma forma que entraram, poderiam ser removidos”, revela Taynara.
METAIS PESADOS
Hoje, trabalhando em parceria com outra pesquisadora, a empreendedora explica que se assustou com a frequência da ocorrência de metais pesados em frutas, verduras e legumes adquiridos em feiras livres para testes do produto: “Não sendo um alimento orgânico, é quase certo que terá quantidades significativas de metal pesado”.
Ela esclarece que as pessoas estão expostas a metais pesados de diversas outras fontes além dos alimentos in natura – como a própria água e o ar –, mas defende que a eliminação desse fator pode ajudar a prevenir excessos: “A questão é que poderíamos estar menos expostos. Esse acúmulo acaba gerando uma conta mais alta do que o necessário para o organismo”.
A intenção é despertar o interesse de empresas de alimentação saudável, como marmitarias e empresas de sucos naturais. Outra ideia é fornecer o produto para marcas de frutas e vegetais embalados.
“Para isso, queremos obter uma espécie de selo de qualidade para auxiliar na comunicação com o consumidor final”, explica. “Com nosso produto, o alimento se situará entre o convencional e o orgânico em termos de valor”, prevê.
QUANDO CHEGA AO MERCADO?
Para viabilizar o modelo, a startup está percorrendo um longo caminho de testes laboratoriais e processos de validação junto a órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), além de seguir buscando novos investidores. “É tudo muito burocrático”, conta.
Por enquanto, o produto é fornecido apenas de forma experimental para microempreendedores. “Tudo ainda é um teste para sentir o mercado. Por ser uma startup de cunho científico, o investimento vem a passos curtos. Até a comercialização em massa, são necessários muitos estudos, e cada mudança demanda novas pesquisas, que custam caro. Isso exige muito mais paciência de possíveis investidores”, explica.
AGROQUÍMICOS, UM MAL NECESSÁRIO
Segundo a fundadora da InQuímica, o excesso de metais pesados em alimentos é, em geral, resultado da má utilização dos agroquímicos – muitas vezes aplicados com frequência acima da recomendada.
“Metais pesados, como níquel, cobre e enxofre, em doses certas, são nutrientes para os alimentos”, explica.
Pesquisadores da área apontam dificuldades para quantificar a contaminação de alimentos por metais pesados no Brasil, e instituições como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) veem falhas na fiscalização governamental.
Para Taynara, contudo, a não ser que ocorra uma mudança drástica nos modelos de produção e consumo de alimentos, os efeitos negativos do uso de agroquímicos serão sempre um problema a ser remediado – daí a importância de soluções como o “Puro e Bom”.
“Novos agroquímicos orgânicos e biodegradáveis podem surgir, mas a tendência é que o problema não termine”, acredita.
SOLUÇÕES
Com isso em mente, a cientista e empreendedora explica que também está entre os planos criar soluções para outras etapas dessa cadeia. Uma das ideias é desenvolver um produto para eliminar metais pesados do solo.
“É tudo uma questão de prática. Conseguindo a certificação para o ‘Puro e Bom’, as coisas devem caminhar mais facilmente”, conclui.
Taynara Alves, fundadora da startup InQuímica que criou produto para descontaminar alimentos in natura
ALIMENTOS SAUDÁVEIS PARA O MUNDO TODO
O mundo precisa produzir alimentos para cerca de 7,5 bilhões de pessoas. Estima-se que quase metade dos alimentos hoje produzidos globalmente não existiriam sem o controle químico de insetos-praga, doenças e plantas daninhas.
Os agrotóxicos, se por um lado apresentam reconhecidas limitações quando utilizados indiscriminadamente, por outro lado são indispensáveis para garantir a produção de alimentos suficientes para todos os cidadãos do planeta.
No entanto, agrotóxico é a última ferramenta indicada no controle das pragas. Antes dele, recomenda-se aos produtores buscarem uma alternativa do controle cultural e/ou biológico das pragas que querem combater. De qualquer forma, há opções para o uso responsável que envolvem os menores riscos possíveis.
A Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, ligada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - diz que "sabe-se que a utilização indiscriminada desses produtos desencadeia processos de contaminação, com consequências muitas vezes irreversíveis" e que constantemente tem tomado ações de mitigação e racionalização do emprego desses compostos.
O acompanhamento, a fiscalização e a educação para o uso responsável pelos produtores no campo são fundamentais tanto para a saúde da população, quanto para o solo e os rios.
COMPLICAÇÕES POR METAIS PESADOS
Conheça riscos associados a alguns dos principais metais pesados encontrados em alimentos in natura:
Interfere no sistema nervoso, medula óssea e rins, além de agir como promotor do câncer.
Comum em fertilizantes e encontrado em alimentos e na água, o metal tem excreção lenta pelo organismo humano e acumula-se nos rins.
Apresenta maior risco para o trato respiratório. Em casos de exposição elevada, sintomas podem ir de dores de cabeça a edema pulmonar.
Pode causar danos ao sistema respiratório, cardiovascular, nervoso e sanguíneo. Também tem sido associado ao câncer de pele e brônquios.
Fonte: Departamento de Microbiologia da Universidade de São Paulo.